Já vi tudo que ainda não vi. O tédio constantemente novo, o tédio de descobrir, sob a falsa diferença das coisas e das ideias, a perene identidade de tudo, a semelhança absoluta entre a mesquita, o templo e a igreja, a igualdade da cabana e do castelo, o mesmo corpo estrutural a ser rei vestido e selvagem nu, a eterna concordância da vida consigo mesma, a estagnação de tudo que vivo só de mexer-se passando. Paisagens são repetições. Numa simples viagem de comboio inútil e angustiadamente entre a inatenção à paisagem e a inatenção do livro que me entreteria se eu fosse outro. Tenha da vida uma náusea vaga, e o movimento acentua-ma. Só não há tédio nas paisagens que não existem, nos livros que nunca lerei. A vida para mim é uma sonolência que não chega ao cérebro. (221-222)
* um tema constante no Livro do Desassossego é a paisagem inerte, outra. O ser?